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Português descobre que basta uma Mutação Genética para o Cancro

O investigador, a trabalhar na Universidade de Harvard, verificou que o aparecimento de cancro é muito mais rápido do que se pensava. E fê-lo com levedura de cerveja.

Há seis anos que Miguel Costa Coelho estuda a forma como o cancro aparece nas células. No laboratório do professor de genética molecular na Universidade de Harvard, Andrew Murray, o investigador português usou Saccharomyces cerevisiae, ou levedura de cerveja, para analisar como surge a instabilidade genética que pode dar origem ao cancro. Os resultados desse trabalho, feito com a colaboração de outro investigador português Ricardo Pinto, foram publicados no início deste ano na revista Nature. A SÁBADO falou com o cientista.

Como começou a investigação?O trabalho começou com uma questão muito simples. Estamos sempre à procura do que é que causa o cancro e o que é que o torna mais agressivo. A maior parte das vezes, os estudos começam por destruir um gene para ver o que acontece à célula - é o chamado knock out. O que nós fizemos foi diferente, deixámos o sistema evoluir para ver como é que a instabilidade genética acontece, como é que o cancro surge. Depois, sabendo como isso acontece vamos atrás – como se viajássemos no tempo – e vamos procurar qual foi a primeira mutação que originou tudo.
O que descobriram?Descobrimos algo que contraria um dogma que existe desde os anos 50: que são precisas duas mutações para o cancro começar. Nós temos duas cópias de cada gene e o que foi postulado é que se destruirmos as duas cópias de um gene que é guardião de cancro, então as células transformam-se em células cancerígenas.
O que é um guardião de cancro?Há muitos genes que, basicamente, fazem com que as nossas células se mantenham saudáveis. Quando estes genes são destruídos por processos de mutação, as células tornam-se instáveis e tornam-se cancerígenas. Há genes famosos na área do cancro como o P53 que é um dos guardiões dos genomas e protege as células de adquirem instabilidade genética e cancro.Mas o nosso estudo demonstra que a instabilidade genética acontece de forma muito mais rápida. Basta apenas uma mutação de um gene para o cancro surgir. As tecnologias atuais detetam mais facilmente este tipo de mutações nas duas cópias, por isso foi preciso recorrer a metodologias de evolução experimental para chegarmos lá.
Como chegaram a esta conclusão?Quando retiramos uma amostra de um doente e analisamos o genoma de um cancro, este tem muitas mutações e é muito difícil perceber qual foi a primeira que deu origem ao processo cancerígeno. O que usámos foi um modelo de evolução experimental em que podemos reproduzir esse passo várias vezes e ver como acontece.
O que fizeram concretamente?Colocámos as células levedura sobre pressão para que eles se tornem cancerígenas. Como se fosse um pressão seletiva. Pomos as células normais a comportarem-se como células cancerígenas. Mas fazemos isso de forma muito controlada que nos permite aceder às primeiras mutações.
Como pressionam as células?Temos de obrigar as células a adquirirem capacidade de mutar rapidamente e fazemos isso com três drogas. As drogas interagem com alguns genes e a única forma que as células têm de sobreviver é tornarem-se mais rápidas e ficam geneticamente instáveis. Este é o primeiro passo para que células normais se tornem células cancerígenas. 
Em termos concretos o que significa esta descoberta?As implicações são enormes. Embora seja muito difícil identificar quando é que um cancro começa, se já soubermos quais são os genes que temos de procurar fica mais fácil diagnosticá-lo. Eu tenho uma lista de genes que o meu trabalho gerou que pode ajudar a identificar os cancros que têm instabilidade genética e os que não têm.
A aplicação mais direta é no tratamento. Sempre que tratamos um cancro temos de usar uma droga ou radioterapia que, como no meu estudo, vai criar uma pressão seletiva sobre as células e a única forma que estas têm de sobreviver é tornarem-se geneticamente instáveis. Quando passados uns meses ou anos há uma reincidência, esse cancro é muito mais agressivo porque é instável e mais resistente a novos tratamentos.
É importante alertar para este facto porque pode determinar como é que vamos desenhar estratégias para tratar o cancro. Temos de pensar de uma forma diferente, fazer com que a adaptação seja mais lenta. Em vez de usarmos uma droga, talvez tenhamos de usar duas ao mesmo tempo. Ou vamos ter de usar drogas desenhadas para prevenir a instabilidade genética.
Estes fármacos já existem?Há novos compostos e podemos começar a testá-los nos genes-alvos que descobri. Até agora as drogas procuravam destruir a maior parte das células cancerígenas, quer estejam instáveis ou estáveis. Mas o que acontece é que as instáveis adaptam-se. Quando o cancro volta a crescer é muito difícil tratar porque as células são todas instáveis, vão ser capazes de se adaptar a qualquer droga a que sejam sujeitas.
Estamos a ficar sem munições para travar o cancro, mas se mudarmos a forma como o atacamos na primeira instância vamos reduzir a frequência desta instabilidade genética e desta adaptação.
Qual é o próximo passo da sua investigação?O próximo passo vai ser testar como é que a instabilidade genética evolui num modelo de organoides, que são matrizes celulares com propriedades semelhantes aos nossos tecidos e órgãos. Temos de olhar para tipos de cancros específicos, porque a instabilidade genética pode ser diferente dependendo do tipo que órgão ou tecido.
A segunda parte é usar modelos de ratinho para ver como a instabilidade genética evolui no animal. Num plano mais tardio, quando tivermos estes resultados, vamos procurar drogas que façam uma de duas coisas: que previnam a instabilidade genética ou que destruam as células que são geneticamente instáveis com mais especificidade. E aí vamos conseguir atrasar mais a reincidência de cancros e tumores secundários.
Isso é um trabalho para quantos anos?É um trabalho, no mínimo para seis anos. Mas até chegarmos a uma droga são 10 a 12 anos.

FONTE: https://www.sabado.pt/ciencia---saude/detalhe/portugues-descobre-que-basta-uma-mutacao-genetica-para-o-cancro-surgir?ref=SEC_Destaques_ciencia---saude
The creation of this blog came from a challenge posed to Masters students of Biomedical Sciences of the University of Beira Interior, Covilhã (Portugal), by Professor Doctor José Eduardo Cavaco within the course "Project in Biomedical Sciences''. The Biomedical Sciences combine the areas of Biology, Biochemistry, Physics, Management and Engineering, stimulating the capacity for self learning, critical thinking and adaptation to new technologies. Thus, the Biomedics integration in different areas of the national and international job market is possible as technical supporters in clinical environment, consulting, industry, education and research. For more information: http://www.ubi.pt/Curso/907.

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